De moradia a centro cultural, Vila Itororó é um marco na arquitetura de SP
Construída em 1920, a Vila Itororó contempla um conjunto remanescente de edificações que, a partir de 2013, tornaram-se patrimônio histórico da cidade
Por trás de uma discreta entrada localizada na Bela Vista, na capital paulista, está a Vila Itororó, um espaço público e cultural da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo que contempla um conjunto remanescente de edificações construídas nos anos 1920, e que está em fase de restauro desde 2019.
A partir da sua construção, a vila sempre teve a moradia como uso principal, porém tornou-se patrimônio histórico da cidade de São Paulo e foi desapropriada para fins culturais a partir de 2013.
Com a entrega da primeira fase do projeto de restauração em 2019, que apresenta a assinatura do Instituto Pedra — uma organização sem fins lucrativos que desenvolve ações no campo do patrimônio cultural —, a Vila Itororó foi inaugurada e aberta ao público em setembro de 2021 com diversas atividades artísticas e culturais ativando espaços já restaurados e áreas comuns que foram revitalizadas.
A Vila leva este nome em homenagem à nascente do Riacho do Itororó – que ficava onde hoje se encontra a Avenida 23 de maio – e que abastecia a piscina da vila, que foi a primeira particular de São Paulo.
Restauração em andamento
A primeira etapa do projeto de restauração da Vila Itororó durou cinco anos e englobou a realização dos projetos arquitetônicos para todas as 11 edificações e áreas comuns do conjunto.
“A Vila Itororó é um projeto que a gente executa em parceria com a prefeitura de São Paulo, que é gestora e dona do espaço. A gente fez tanto a parte de restauração arquitetônica — os projetos e a gestão da obra —, quanto toda a parte de educação patrimonial do projeto”, explica Alan Gualberto, gerente de projetos da instituição.
O Instituto Pedra iniciará agora o projeto para captar recursos para uma nova etapa: a restauração da fachada da Casa 8, que é o principal palco de eventos e espetáculos na Vila Itororó desde a reabertura, em 2021, e a recuperação de sua cobertura é fundamental para salvaguardar o patrimônio construído da casa que está na atual entrada principal da Vila.
A ação será via ProMAC, lei municipal que permite que empresas destinem parte do ISS para projetos culturais.
Por trás dos tijolos
Tijolos, telhas, manilhas hidráulicas e outros elementos construtivos cerâmicos, embora tenham origem milenar, somente se tornaram populares no Brasil com a industrialização do país, na virada do século XIX para o século XX.
O seu uso, na cidade de São Paulo, foi um dos propulsores para o expressivo crescimento urbano vivenciado naquele momento, representando a “virada” da cidade colonial, que era produzida com técnicas construtivas em terra crua – mais lentas e artesanais – para a cidade “moderna”, onde a alvenaria de tijolos cerâmicos e outros elementos industrializados possibilitaram um encurtamento dos tempos construtivos e o surgimento de novas escalas arquitetônicas e urbanas.
A Vila Itororó é um conjunto arquitetônico que é testemunho desse processo, onde pode ser vista uma grande variedade desses materiais cerâmicos, de diversas procedências e com as mais variadas aplicações.
“Diferente das outras vilas que a gente vai encontrar, essa não é uma vila operária, ela já tem um caráter mais burguês, até a arquitetura mostra isso”, explica Alan Gualberto, gerente de projetos do Instituto Pedra.
Estudos recentes, realizados durante as obras de restauração do conjunto arquitetônico da Vila Itororó, trouxeram à tona essa variedade de origens e técnicas de aplicação, que acabam representando um momento muito específico da história da construção civil em São Paulo, em que a substituição de materiais, por conta da industrialização, ocorreu de forma muito intensa e, ao mesmo tempo, experimental.
Essas pesquisas fizeram uma abordagem de natureza arqueológica, ou seja, utilizando-se de análises qualitativas e métricas feitas no local, junto com informações bibliográficas, para compreender o contexto histórico e os fenômenos sociais que produziram aquele conjunto arquitetônico, formulando diversas hipóteses sobre sua produção e modificação ao longo do tempo, que resultaram em uma arquitetura singular, hoje valorizada como patrimônio cultural.
O Palacete da Vila Itororó
O Palacete da Vila Itororó, inaugurado em 1922 como monumento comemorativo ao centenário da Independência do Brasil, foi projetado para ser a residência oficial de Francisco de Castro, um empreendedor paulista que idealizou todo o espaço da Vila Itororó nos anos 1920.
O palacete de quatro pavimentos, com 32 cômodos, foi criado em várias etapas e era também adornado por colunas gigantescas, esculturas, fontes, áreas ajardinadas e outros adereços.
“Olhando para os vitrais do Palacete, a gente vai ver uma série de referências aos países amigos, as nações que participaram do processo de independência”, conta Alan.